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Resumo: Arquitetura do Nevoeiro

  • Foto do escritor: Beatriz Lourençoni Monteiro
    Beatriz Lourençoni Monteiro
  • 15 de jul. de 2021
  • 4 min de leitura

A sobreposição explosiva de opacidade e nitidez, incerteza e convicção, no tempo da “pós-verdade”. Escrito pelo arquiteto Guilherme Wisnik e publicado em setembro de 2018.



O autor inicia o texto explicando sobre a “sociedade da hipervisibilidade” na qual parte importante na população mundial possui aparelhos tecnológicos que permitem acesso imediato a fotos e a diversas informações sem necessidade de ir a uma biblioteca. Essas mesmas pessoas confiam tanto nas informações produzidas na internet que nem se importam se as mesmas são reais ou não. O arquiteto traz uma comparação com uma espessa névoa, afirmando que vivemos em um momento dual de nublamento (opacidade no sentido de compreensão geral das situações) e nitidez (aumento da acessibilidade de informação) que gera o fenômeno do “Pós- verdade”.

De acordo com Wisnik, essa alta acessibilidade de informação não corresponde apenas à população em geral, mas também às pessoas com certa forma de “poder”. Estamos tão acostumados a partilhar e acompanhar o que é partilhado que não nos preocupamos se somos vigiados, ou o que fazem com as informações que postamos. Ele dá como exemplo os drones, que inicialmente eram utilizados pelos militares para vigiar o inimigo ,e hoje, possuem diversas finalidades casuais para civis comuns. Entretanto, ainda possuem poder de vigilância, pois o medo de outro ataque como o 11 de setembro faz com que, em alguns lugares, as pessoas sejam vigiadas por esses aparelhos quase imperceptíveis.

Dando continuidade ao texto, o ensaísta conta a história do aparelho antecessor ao drone, a câmera fotográfica. O autor descreve historicamente a máquina como uma evidenciadora da verdade. Uma vez que quando foi descoberta encantou vários filósofos, pois conseguia ver além da percepção visual humana. Ele compara a visão humana à de um curandeiro, que trata do paciente a certa distância deste. Já a câmera fotográfica é comparada à de um cirurgião que corta e se aprofunda dentro do paciente enxergando coisas que um curandeiro não pode ver.

Visto que a câmera se tornou um aparelho revelador de verdades imperceptíveis à ótica humana, Wisnik conclui que hoje, com a invenção das nanotecnologias, se tornou muito fácil expor camadas ocultas da realidade de forma imperceptível. No entanto, o arquiteto frisa que, juntamente com a nanotecnologia, aparatos de edição de áudio e vídeo também se desenvolveram. Logo, essas informações ocultas que, muitas vezes, são reveladas como verdades incontestáveis podem ter sido manipuladas, a realidade é distorcida, o que cria as chamadas fake news.

Essas “verdades fabricadas” também são bem distribuídas. Elas são impulsionadas pelas chamadas redes sociais (como Facebook, YouTube, Whatsapp etc.) e direcionadas a grupos de pessoas inclinadas a acreditar nessas informações. Diante disso, Guilherme conclui que “o discurso da nitidez propagado pela internet revela-se falacioso”. Ele também afirma que esse discurso é apoiado em práticas de falseamento e manipulação de opiniões e é construído pela ação consecutiva de algoritmos em um grande nevoeiro que esconde interesses políticos e econômicos.

O arquiteto acrescenta informações sobre as chamadas “nuvens de armazenamento”. Segundo ele, a nuvem é uma grande metáfora que aparece como um meio progressivamente acessível, porém esconde uma gigantesca infraestrutura física que, além de mantê-la funcionando, gera uma série de problemas ambientais como escavações e poluições de lagos e rios. Wisnik reflete que as informações deixadas na nuvem acabam se tornando algoritmos que trazem confiabilidade às fake news, tornando todos os usuários prisioneiros voluntários.

Ele também discorre sobre a trajetória de Steve Jobs, criador da marca Apple. Acentua a ocultação misteriosa característica da marca, que cria produtos totalmente fechados e protegidos de provenientes vasculhamentos. O autor até compara esses produtos com caixas pretas, revelando a mania de controle de Jobs que não gostaria que “xeretas indesejados” descobrissem o segredo de seus aparelhos.

O fato de não poderem ser abertos e de possuírem um design sedutor levou a marca ao topo do mercado mundial. Além disso, segundo o arquiteto, a Apple ajudou a construir o estilo de vida que temos hoje, o estilo de armazenarmos cada vez mais dados na nuvem, que pode ser acessada a qualquer hora e a qualquer lugar. Essas informações são isoladas em sistemas fechados e autônomos, dos quais não temos controle e podem ser ferramentas de poder para aqueles que as possuem.

Relacionando a quantidade absurda de dados despejados na nuvem com o famoso junkspace (lixo espacial), Guilherme Wisnik explica que ,para garantirmos acesso às informações postadas na internet, somos capazes até de abrir mão de toda a nossa privacidade, auxiliando no rastreamento de nossas impressões digitais deixadas em um grande junkspace de informações. Acabamos contribuindo com um modo de vida estilo reality show, no qual somos vigiados e formatados por algoritmos, ao clicar na opção “concordo” que, como escreve o arquiteto, assinamos com atenção flutuante.

Para encerrar, o ensaísta dá exemplos de vários filmes e livros que descrevem exatamente esse reality show, e também apresenta a definição de nevoeiro de acordo com os relatos mitopoéticos dos índios da América. Essa névoa representa tanto um fenômeno atmosférico quanto a fumaça do preparo de alguns alimentos. Entretanto, essa névoa também é espessa e se interpõe entre os homens reinstaurando o mundo alterando a ordem das coisas. O arquiteto conclui escrevendo sobre o filme Zona de Stalker que, por diversas razões se tornou um prenúncio da tragédia de Chernobyl em 1986. Uma névoa química que talvez tenha marcado o fim de uma camada soviética e o início de outra capitalista marcada, segundo ele, pela hegemonia sublime das nuvens.

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